Boate Kiss: médico socorrista que atuou no incêndio e sobrevivente que decidiu cursar medicina fazem plantão juntos em hospital
24/02/2024
Médico Carlos Dornelles foi o primeiro a entrar na boate após o incêndio e organizou a transferência dos feridos de Santa Maria para Porto Alegre. Gustavo Cadore, estudante de medicina, estava entre eles. Os dois se reencontraram em Santa Cruz do Sul. Carlos Dornelles, à esquerda, e Gustavo Cadore, à direita, durante plantão no Hospital Santa Cruz
Arquivo pessoal
Das voltas que a vida dá: o plantão no pronto-atendimento do Hospital Santa Cruz, em Santa Cruz do Sul, a 153 km de Porto Alegre, entre a noite de quinta (22) e a madrugada desta sexta-feira (23), foi especial para o médico Carlos Dornelles e para o estudante de medicina Gustavo Cadore.
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Dornelles foi o primeiro socorrista a entrar na boate Kiss, em 27 de janeiro de 2013, após o incêndio que atingiu o local. Ele atendeu os feridos e organizou toda a transferência dos casos mais graves de Santa Maria para Porto Alegre. Ao todo, 57 feridos chegaram à Capital de avião ou helicóptero. Cadore estava entre eles.
"Jamais passou pela minha cabeça que eu pudesse aprender com a pessoa que me ajudou daquela vez. É muito gratificante. Não tenho palavras para agradecer", conta Cadore.
Motivação
Hoje com 42 anos, Cadore estava com a defesa da tese de doutorado em medicina veterinária marcada para março de 2013, quando houve incêndio. Foi uma das últimas pessoas a sair da boate com vida, teve quase 40% do corpo queimado e ficou nove dias em coma no Hospital de Pronto Socorro de Porto Alegre. Precisou passar por dezenas de cirurgias até que pudesse retomar a vida.
Ele diz que a tragédia fez com que amadurecesse, aprendendo a valorizar o que, para ele, realmente importa na vida. Concluiu o dourado e, nessa reflexão, voltou a pensar em uma antiga vontade que tinha e que existia desde a época em que optou pela medicina veterinária nos anos 1990: a de cursar medicina.
"Sempre tive essa vontade. E o incêndio me fez pensar mais nisso. Eu estive em uma situação de depender muito dos outros para fazer coisas que a gente dá como garantidas: respirar, caminhar, comer. Eu não conseguia tomar um copo de água sozinho. Agora, posso retribuir", conta.
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Reencontro
E foi aí que a vida começou a dar as suas voltas. Cadore prestou vestibular para algumas universidades e passou na Universidade de Santa Cruz do Sul, que tem convênio com o Hospital Santa Cruz, onde Dornelles trabalha.
Cadore diz que tomou conhecimento do papel de Dornelles na sua vida há cerca de um ano, mas nunca havia falado com o médico. Quando saiu a escala do plantão, na terça-feira (20), o socorrista reconheceu o nome do aluno.
"Foi o acaso que nos reuniu. Carlos quase chorou e eu também", brinca Cadore.
"[Foi] Gratificante. [Me sinto] honrado em poder aprender com ele. Eu passei pelas mãos dele sem nem saber [em 2013]. Trocamos muita ideia esta noite. Foi muito legal".
Julgamento é suspenso
Por decisão do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, o novo júri dos réus pelo incêndio da Boate Kiss foi anulado. O julgamento começaria na próxima segunda-feira (26), em Porto Alegre.
O ministro atendeu a um pedido do Ministério Público do Rio Grande do Sul. Toffoli considerou que a realização de um novo júri poderia causar "tumulto processual", uma vez que ainda há recursos pendentes sobre o primeiro julgamento, realizado em 2021 e anulado pelo Tribunal de Justiça do RS.
Com a decisão, as condenações de Elissandro Spohr, Mauro Hoffmann, Luciano Bonilha Leão e Marcelo de Jesus dos Santos, com penas que vão de 18 a 22 anos e meio de prisão, perderam validade. Eles chegaram a ser presos, mas posteriormente foram postos em liberdade.
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